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Título(s) Alternativo(s): Before I Die
Título Nacional: Na Mira da Morte Direção: Peter Bogdanovich Elenco: Boris Karloff, Tim O’Kelly, Peter Bogdanovich, Nancy Hsueh, James Brown Ano: 1968 País: EUA Duração: 90 min Sinopse: Um astro dos filmes de horror decide aposentar-se quando se confronta com a decadência; um típico rapaz norte-americano resolve se armar para enfrentar o mundo num rompante de fúria homicida. O destino vai levá-los a um conflito insólito e decisivo. |
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É muito difícil contestar aquela máxima que diz que “a criatividade nasce da adversidade” quando lembramos da escola que formou a maior parte dos gigantes do cinema norte-americano em atividade. Esta escola obedecia a um código espartano ditado por um mestre cuja autobiografia se intitula: “Como fiz uma centena de filmes em Hollywood sem nunca perder um centavo”. O nome dele? Roger Corman.
Francis Ford Coppola começou a carreira no cinema remontando e dublando filmes científicos russos para lançá-los nos drive-ins americanos como ficção científica; dirigiu seu primeiro filme usando sobras de negativo de uma produção de Corman. Martin Scorsese se mudou de Nova York para a costa oeste junto com um bando de estudantes para ter uma chance trabalhando de graça, ou melhor, “ganhando experiência” sob a supervisão de Corman.
Os exemplos acima podem ser bastante conhecidos, mas nenhum deles é tão curioso ou anedótico quanto o de Peter Bogdanovich. Crítico dedicado ao resgate dos autores clássicos de Hollywood, Bogdanovich parte de mala e cuia para Hollywood depois de receber um convite de Corman. Como todos os “aprendizes”, faz de tudo: produção, roteiro, montagem, assistência de direção (o que num filme de Corman quase sempre significava dirigir metade do filme). Finalmente, vem a grande chance, em forma de missão: Boris Karloff deve dois dias de trabalho ao produtor – a tarefa de Peter é aproveitar vinte minutos de seu último filme e completar a metragem faltante com material original (usando Boris – é claro – e as sobras das sobras de material cênico e tudo mais, com um orçamento total equivalente ao salário de um executivo médio de um grande estúdio qualquer).
A solução pra essa enrascada foi tão simples quanto brilhante (e contou com uma ajudazinha de outro mestre, Samuel Fuller): Na Mira da Morte começa por uma sequência extraída de Sombras do Terror, um dos últimos e mais estranhos exemplares do gênero “terror medieval” realizados por Corman. Corta para Byron Orlock (Boris Karloff) assistindo à projeção na companhia do diretor e dos produtores. Sua reação: “esse é o pior filme que já fiz na vida”. Orlock acha que seus monstros estão ultrapassados e não provocam nada mais senão o riso das novas gerações, acostumadas com massacres reais televisionados cotidianamente. Ele se decide pela aposentadoria, não sem antes cumprir com um último compromisso, uma aparição pública num drive-in.
Paralelamente, acompanhamos a trajetória de Bobby Thompson, um jovem que prepara e alimenta um alucinado plano de fuga da realidade insuportável dos suburbs. O plano consiste basicamente em trucidar a família e praticar tiro ao alvo do alto de uma caixa d’água, onde os alvos são os motoristas desavisados que atravessam uma highway de Los Angeles.
É impressionante que Na Mira da Morte tenha sido realizado por um diretor declaradamente pouco interessado em filmes de horror. Não é só o respeito por um ícone do gênero que transparece em cada plano do filme, mas verdadeira devoção. Karloff encarna seu último papel com muito mais que sua elegância costumeira: há momentos, como aquele em que Karloff narra sua “história de terror”, onde o mito cede passagem a um ser atormentado em face da proximidade da morte e do medo do esquecimento. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma das mais memoráveis caracterizações de Karloff, na linhagem direta dos monstros frágeis e carismáticos que ele interpretou para a Universal. |
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Fernando Veríssimo |
10/03/2005 |
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